segunda-feira, 25 de junho de 2012

Kardec: - "Antes de Crer, Compreender"






“Estudai primeiro e vede depois, porque compreendeis melhor”
Allan Kardec – Revista Espírita, maio de 1861



Estas palavras de Allan Kardec remetem claramente à questão FÉ CEGA x FÉ RACIOCINADA, pois a crença, no sentido da FÈ CEGA, vem a ser a falta de razão em atividade, ou seja, sem o estudo e pesquisa, não se chega a uma conclusão (racional) por si mesmo, mas sempre a uma aceitação de uma idéia pronta de terceiros.

Em nossa vida, quantas vezes acreditamos em algo, só porque nos contaram (geralmente na infância) e ao chegarmos a idade adulta, ao questionarmos, vimos que a maior parte delas feriam a razão? E crenças assim, obtidas desse modo, que se instalaram, cresceram e contaminaram toda uma coletividade, mais tarde vem a dominar a muitos, sem que NINGUEM possa justificar o porquê racional de crer naquilo e dizem apenas:
- Eu creio por que creio ou;
- Eu creio por que me disseram assim ou;
- É assim porque é (e não aceito que me digam que não é - mesmo que provem).

Estes argumentos acima me lembram a velha dicotomia entre FATOS (que podem ser comparados à FÉ RACIOCINADA) e OPINIÕES (que são comparáveis à FÉ CEGA), e darei um exemplo, tirado do livro “O LAÇO E O CULTO”, de Krishnamurti Carvalho Dias:


"Se alguém me pergunta pelo meu nome, só tenho que dizê-lo tal qual eu me chamo realmente, como consta de minha certidão de nascimento, de minha carteira de identidade, pois isso é um fato que não admite opinião.

Não posso pensar ou achar, julgar ou acreditar, que me chamo assim ou assado: sei que meu nome é exatamente aquele conjunto de fonemas ou sons, aquele conjunto de letras ou palavras, que expressa minha identidade pessoal.

Não opina, mas revela um fato, quem declina o próprio nome. Eu também não estou opinando, ao revelar meu endereço, meu telefone. São fatos, só tenho que informar esses dados reportá-los num ato de informação.

Todavia, se me perguntarem aquela bobagem: “De onde foi que seu pai tirou esse nome para lhe dar?”, já haverá espaço para um ato de opinião. Posso saber exatamente como foi à mecânica da escolha de meu nome por meus pais, como posso ignorar redondamente, tanto quanto posso apenas conjeturar a respeito. No caso de não saber exatamente, então fabricarei uma resposta opinativa, dizendo que, segundo acho, foi assim ou assado.

Eis a diferença entre fato e opinião, entre opinião e informação.

Informação é quando se revela um fato, algo que aconteceu realmente, independente de nós. Existe e pronto. Só cabe-nos informar a respeito.

Já a opinião leva há um pouco de nos mesmos, sob a forma de julgamento nosso, geralmente um juízo de valor e é por isso que nos afeta tanto quando vemos uma querida opinião que expendemos, ser esmerilhada sem dó pelos outros.


Se me perguntarem – “que horas são?” - o certo é limitar-me a informar o que me revela o mostrador do relógio que tenho ao pulso, sem mudar nada. O relógio reporta um fato, devo passar essa informação ao outro sem influir no dado, pois isso é informação. Todavia, se opto dizer – sem olhar para o relógio – que ACHO que ainda é cedo, ou tarde, ou que são tantas horas, pois não faz cinco minutos olhei para o relógio e era mais ou menos isso etc. estou fugindo ao fato, recusando-me a acessar e produzir uma informação, para fazer um mero exercício de opinião, a qual poderá refletir meu mau humor, meu desinteresse pela necessidade do interlocutor de apurar a marcha do tempo, minha irritação por um fato puramente irrelevante, que nada tem a ver.

Opiniões podem conter doses de preconceito, emoção, má vontade, alienação, muita coisa alheia, estranha aos fatos, expressando nesse caso o que em língua inglesa se chama “desinformação”.

Pois bem, com o espiritismo, acontece o mesmo, ou seja, alguns compreendem o FATO espírita e o informam e não apenas informam, mas procuram se informar mais sobre o mesmo, sempre baseados nas diretrizes da FÉ RACIOCINADA e métodos que a doutrina nos traz e outros, procuram passar adiante OPINIÕES, que não conseguem explicar, de forma racional e com embasamento, o porquê acreditaram nelas, o que, como já vimos, se caracteriza como uma FÉ CEGA.


É necessário, portanto, que sobre a FÉ CEGA, se sobreponha a FÉ RACIOCINADA, ou seja, se questione os fatos com base no CONHECIMENTO adquirido e também buscar conhecimentos, se os que já se tem, não bastarem para dar base à CERTEZA. Não se pode simplesmente confiar no que o outro diz sem analisar, seja quem diz, mesmo um médium de renome ou espíritos famosos, e Kardec sempre recomendou que passássemos as comunicações mediúnicas pelo crivo da razão. Os espíritas brasileiros deixaram de ler o Livro dos Espíritos e Livro dos Médiuns e preferiram ler Nosso Lar, Zíbia e Violetas Na Janela? Se foi isso, parafrasearei o Senhor Omar, do seriado “TODO MUNDO ODEIA O CHRIS”:
- Trágico, trágico!

Peço, por essa razão, licença, para trazer alguns trechos do discurso do Sr. Allan Kardec, no novo ano social, pronunciado na sessão de 5 de abril de 1861, que se encontra publicado na Revista Espírita, do mês de maio do mesmo ano, sendo que recomendo a todos que puderem, que leiam todo o discurso, pois é muito interessante. Mas, antes leiam os trechos trazidos, com muita atenção:

"(...) Por outro lado, sabemos, por experiência, que a verdadeira convicção só se adquire pelo estudo, pela reflexão e por uma observação contínua, e não assistindo a uma ou duas sessões, por mais interessantes que sejam. E isto é tão verdadeiro que o número dos que crêem sem ter visto, mas porque estudaram e compreenderam, é imenso. Sem dúvida o desejo de ver é muito natural e estamos longe de o censurar, mas queremos que vejam em condições aproveitáveis. Eis por que dizemos: Estudai primeiro e vede depois, porque compreendeis melhor.


Se os incrédulos refletissem melhor sobre esta condição, para começar veriam nela a melhor garantia de nossa boa fé e, a seguir, a força da doutrina. O que mais o charlatanismo teme é ser compreendido; ele fascina os olhos e não é tão tolo para se dirigir à inteligência, que facilmente descobriria a carta escondida. Ao contrário, o Espiritismo não admite a confiança cega; quer ser claro em tudo; quer que lhe compreendam tudo e que se dêem conta de tudo. Então, quando recomendamos estudo e meditação, pedimos o concurso do raciocínio, o que prova que a Ciência Espírita não teme o exame, desde que antes de crer sentimos a necessidade de compreender.

(...) Disse que as nossas não são sessões de demonstração; mas se as fizéssemos desse gênero, para uso dos neófitos, onde se trataria de instruir e convencer, tudo nela se passaria com tanta seriedade e recolhimento quanto nas nossas sessões ordinárias; a controvérsia estabelecer-se-ia com ordem, de maneira a ser instrutiva e não tumultuosa e quem quer que se permitisse uma palavra fora de propósito seria excluído; então a atenção seria mantida e a própria discussão seria a todos proveitosa. É provavelmente o que faremos um dia. Perguntarão porque não o fizemos mais cedo, no interesse da divulgação da Ciência. A razão é simples: é que quisemos proceder com prudência e não como estouvados, mais impacientes que refletidos. Antes de instruir os outros, quisemos nós próprios nos instruir. Queremos apoiar o nosso ensino sobre imponente massa de fatos e observações, e não sobre algumas experiências isoladas, observadas leviana e superficialmente. No começo, toda Ciência encontra forçosamente fatos que, a princípio, parecem contraditórios e só um estudo minuciosos e completo pode demonstra-lhes a conexão. Foi a lei comum desses fatos que quisemos buscar, a fim de apresentar um conjunto tão completo e satisfatório quanto possível e deixando um mínimo de margem à contradição.


(...)Com este objetivo recolhemos os FATOS, examinamo-los, escrutamo-los no que eles tem de mais íntimo, comentamo-los, discutimo-los friamente, sem entusiasmo; e foi assim que chegamos a descobrir o admirável encadeamento existente em todas as partes dessa vasta Ciência, que toca os mais graves interesses da Humanidade. Tal foi, senhores, até o presente, o objetivo dos nossos trabalhos, objetivo perfeitamente caracterizado pelo simples titulo de Sociedade de Estudos Espíritas, que adotamos. Reunimo-nos com o fito de nos esclarecermos, e não de nos distrairmos. Não buscando uma diversão, não queremos divertir aos outros. Por isso não queremos senão ter ouvintes sérios, ao invés de curiosos, que julgassem aqui encontrar um espetáculo. O Espiritismo é uma Ciência e, como qualquer outra Ciência, não se aprende brincando. Ainda mais, tomar as almas que se foram como assunto para distração seria faltar ao respeito a que fazem jus; especular sobre sua presença e sua intervenção seria impiedade e profanação.

Estas reflexões respondem à censura que algumas pessoas nos dirigiram, por voltar a fatos conhecidos e não procurar constantemente novidades.

(...) Aliás, senhores, não penseis que a opinião dos que criticam a organização da Sociedade seja a dos verdadeiros amigos do Espiritismo; não, é a dos seus inimigos, que estão magoados por ver a Sociedade seguir seu caminho com calma e dignidade, através das ciladas que lhe prepararam e ainda preparam. Eles lamentam que ingressar nela, seja difícil porque ficariam encantados de aqui vir semear a perturbação.


(...)É por isso também que a censuram de limitar o círculo de seus trabalhos, e pretendem que só se ocupa de coisas insignificantes e sem alcance, porque ela se abstém de tratar de questões políticas e religiosas; queriam vê-la entrar na controvérsia dogmática. Ora é isso precisamente o que os denuncia.

(...)Tal qual é hoje professada, a doutrina espírita tem uma amplidão que lhe permite abarcar todas as questões de ordem moral: satisfaz a todas as aspirações, e, pode-se dizer, ao mais exigente raciocínio, para quem quer que se dê ao trabalho de estudá-la e não esteja dominado pelos preconceitos. (...)"

Por tudo isso que Kardec falou, é que fica a necessidade de antes de crermos, ESTUDARMOS para COMPREENDER., pois assim (completando com Krishnamurti C. Dias), é que se ficará livre das opiniões, preconceitos, más vontades e demais coisas alheias ao tema espiritismo, evitando-se a desinformação que vigeu durante muito tempo (e ainda vige) no espiritismo no Brasil e possamos dar seqüência a informação do espiritismo, realmente compreendido.

PS: Para quem não possui a Revista Espírita, aqui vai o texto na íntegra: http://aeradoespirito.sites.uol.com.br/A_ERA_DO_ESPIRITO_-_Portal/Revista_Espirita/Textos/DIS_A_KARDEC_5_ABR_1861.htm




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